quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Experiência: tanto em um primeiro ano

"A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece." (Jorge Larrosa Bondía)

Experiência no PIÁ:
 Período de tempo que atravessa a criança. A criança que atravessa o educador. O educador que atravessa seu companheiro que atravessam as crianças.
 Período de tempo que compartilhamos experiências, experimentos, momentos construídos e degustados conjuntamente.
 Um espaço- tempo que se modela a partir das pessoas que o constituem; espaço- tempo impregnado de características pessoais; que a cada encontro contribuem com suas particularidades. Espaço- tempo construído da e com a história, memória e disponibilidade de cada um.
Espaço - tempo que não se repete; mas se retoma criando pontes entre afetos. Espaço e tempo do caos. Caos em possibilidades vivas.

 Neste primeiro ano no PIÁ precisei redescobrir em mim - como artista e como educadora- novas formas de estar com o outro em criação, de fato, disposta ao encontro. Foi necessário entender como me encontrar com outro educador e juntos (sem nos conhecer totalmente) nos colocarmos a disposição dos artistas pequeninos.
 A primeira ação foi modificar os modelos de expectativas, para construir um objetivo juntos. E isso as crianças nos ensinam muito bem. Elas sabem estar presentes de maneira leve e com uma organização particular, criando um ambiente que manifesta os anseios de cada um, mas juntos, ao mesmo tempo, respeitando cada espaço.
 Durante este período, tive em mente o texto de Federico Garcia Lorca, chamado "Teoria e Prática do Duende", no qual, de uma maneira geral, ele relata os tipos de chama criadora, ou força motriz capaz de nos lançar à vida. Fala do duende como o fator inflamatório, que faz ter força e ardência em todo o artifício planejado e conquistado pelas técnicas adquiridas. Ressalta também que é possível enganar com estados semelhantes de duende - os quais ele chama de musa e/ou anjo -, onde se expressam graças e técnicas, sem que o fogo esteja presente: mas quando ele chega, todos reconhecem.
 Arrisco dizer que o duende transforma a experiência que se passa, em experiência que nos acontece, citando acima Larrosa.Desconfio, agora, que abrigar este duende é o fator que nos permite ter a coragem de nos jogarmos ao caos necessário para provocar a criação e (n)o brincar.
 O encontro do artista-educador pode acontecer sem o "duende", ou com formas similares dele, mas penso que a busca é sempre por este estado de arrebatamento proporcionado por sua chegada; que faz a todos participantes do encontro entenderem que algo especial aconteceu naquele dia e que por isso retornarão na semana seguinte: para retornar a busca incessante do duende - entre a criança e o adulto.
Referências:
 Larrosa, Jorge. "Notas sobre a experiência e o saber de experiência". In: Revista Brasileira de Educação. Universidade de Barcelona, Espanha.Tradução de João Wanderley Geraldi. Universidade Estadual de Campinas, Departamento de Lingüística. Jan/Fev/Mar/Abr, 2002, No 19, Campinas-SP. Lorca, Federico Garcia. "Teoria e Prática do Duende". Obras Completas. Ed. Aguillar. Tradução: Roberto Mallet. Disponível em www.grupotempo.com.br/textos , acesso em 11/07/2015. Postado por: Joice Rodrigues de Lima – CEU Cantos do Amanhecer – Zona Sul

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