segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Lei 8666. Improvisação e Afetos

Ensaio Pesquisa- Ação: Edicléia Plácido Soares


Lei 8666, A Improvisação e Afetos



    Busca-se a improvisação no melhor sentido da palavra, longe dos desentendimentos que consideram o termo índice de displicência, coisa mal feita ou mal planejada busca-se por uma improvisação que nos torne atentos, sensíveis ao aqui e agora, ágeis em criar composições e reelaborações de percursos a partir de vivências, experiências e reflexão sobre situações concretas e prementes. 
      Aspiramos a uma improvisação atenta, que busca coerência numa trama que é realizada em tempo real entre equipamento, equipe, comunidade e secretaria de cultura. A improvisação enquanto estratégia de diálogo com a criança, o entre que se estabelece:  uma proposta adulta  duplicada por dois artistas educadores e a percepção da criança.
       Uma lei existe numa cidade para regular relações entre as pessoas, e no caso do PIÁ para regular a relação entre os artista-educadores e a instituição.

        Segundo a lei 8.666, que regulamenta o PIÁ, somos prestadores de serviço e nosso contrato é  comparável às vezes mais, ou às vezes menos, a uma licitação de materiais para consumo qualquer, certo que tivemos alguns avanços, mas a realidade de um artista educador continua  a mesma, a mercê dos intempéries de uma doença, gravidez , e outros eventos e subjetividades que não constam numa lei de prestação de serviço ou num regimento interno.           Junto à lei, vem a concretude e dureza de um edital e a realidade concreta às vezes acolhedora às vezes dura de cada equipamento.
      Porém, podemos dizer que o programa PIÁ depende muito da subjetividade dos afetos que se estabelecem entre o programa e o equipamento, relação regulamentada pela subjetividade na maioria dos equipamentos, na subjetividade dos afetos que se estabelecem entre os artista educadores de uma mesma equipe, dos afetos que estabelecem entre a equipe e a figura do ae coordenador e dos afetos que se estabelecem entre parceiros artistas educadores e a criança.

      Mas como manobrar estas três instâncias? Como traduzir a lei em ações coerentes e humanas dentro de um processo artístico pedagógico e dentro da realidade de uma equipe de artistas educadores que são necessários um para o outro?
   A possibilidade que encontramos para lidar com estas três instâncias enquanto equipe foi a de criar um regimento interno, ético e colaborativo do PIÁ no CEU Lajeado, este regimento teve por princípio o respeito ao parceiro, à criança e comunidade,  bom senso e confiança  na maturidade de cada um para trabalhar no programa uma vez que todos passaram por um processo seletivo. Este regimento não foi escrito e protocolado em nenhum lugar mas se estabeleceu através da colaboração mútua e responsabilidade. Para tanto fomos  buscando na improvisação estratégias  de sobrevivência entre o visível e o invisível do edital, o tocável e o tocante do dia a dia do processo com  cada parceiro e com as crianças para compreender e decifrar o ambiente, os humores de quem nos  rodeia enquanto parceiros, facilitadores e simpatizantes do PIÁ no CEU Lajeado.



    Sempre ouço dizer que a função de ae coordenador é uma função esquizofrênica, pois está ao mesmo tempo no equipamento participando e criando junto com as crianças e com o parceiro no processo artístico pedagógico desenvolvido, e ao mesmo tempo está presente em reuniões na secretaria de cultura que são muitas vezes abstratas, burocráticas, enfadonhas e em alguns poucos momentos poéticas.

     Neste ano de 2014 refleti sobre esta questão e meu trabalho foi tentar desconstruir essa figura do coordenador que as pessoas têm quando chegam pela primeira vez no programa, ou desconstruir a visão que a sociedade nos induziu a ter, embora o Piá seja um programa que aspira  pela horizontalidade esta  horizontalidade que só acontecerá se pusermos em prática o desapego á centralização da figura do coordenador em todas suas esferas, que  perante a sociedade e as estruturas administrativas tradicionais é o propositor, o produtor, o provedor de  conhecimento e experiência.  Mas descentralizar significa dividir responsabilidades e tarefas, e cabe a nós refletirmos se estamos suficientemente maduros para aceitar responsabilidades e tarefas sem imaginar que seremos o salvador da pátria.


                Quando chegamos no equipamento com a função dupla de coordenar e desenvolver processos com as crianças em parceria com outro artista constatamos que a questão tem mão dupla, acredito que somente quando o coordenador se coloca na postura de “agachamento” no sentido que a Marina Machado cita em seus estudos sobre a relação com a criança, buscando entender e interagir com o coletivo em busca da horizontalidade consegue desconstruir esta figura, no entanto, uma atitude propositiva, autônoma, colaborativa e responsável deve vir também dos outros parceiros.

      Sempre perdemos tempo falando de relações políticas e nos esquecemos   de citar o quanto os processo criativos com as crianças ajudam a desconstruir esta relação tradicional que se estabelece a princípio dentro da equipe.   

   Somente quando todos se colocam como artistas educadores e co-criadores dos processos com as crianças que o obvio emerge, assim como os afetos:  impossível criar e desenvolver um processo de parceria com alguém que você não gosta, não criou vinculo ou afinidade nenhuma, esta afinidade em maior ou menor grau com o tempo acaba acontecendo, e quando isto não acontece, o que acho quase impossível, lembramos que  temos um projeto comum, somos profissionais, recorremos ao edital e a esta lei tão limitada que  regula nossas as relações.

     O que gera o desentendimento é o ouvido e o olhar viciado, obsessivo, que está na defensiva esperando ver e ouvir o esperado, que não espera mudanças de postura, que não está aberto a um discurso de quem de repente tenta se renovar, arejar, arriscar.  E sinto que neste ano de 2014 arriscamos mais neste sentido da desconstrução, uma desconstrução que não foi fácil, chegamos bem próximos a abismos e quase nos diluímos na tentativa de explicar o obvio.


        Enquanto equipe de artistas educadores fomos porosos e aproveitamos os bons ventos que as fricções e angústias gerais produziram,  nos conectamos com redes importantes de valorização dos princípios que o PIÁ tanto acredita, a Ludicidade, a Iniciação, o Tempo de Experimentar, o Processo Criativo, Diálogo, o Pertencimento:  realizamos a “Semana do Brincar” no equipamento, participamos do “Encontro PiÁ, Vocacional e EMIA”, integramos a “Mostra do Encontro Crianças Criando Dança”. Isto tudo porque os processos foram maiores e venceram os desentendimentos, as obsessões, os fantasmas... Aliás eles se tornaram um grande mote no processo desenvolvido com as crianças.


Ensaio Pesquisa Parte II
Processos com as Crianças
















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